Plataforma G2

Dias tão leves, tão densos. O contraste pelo qual se encaminha o mundo inteiro me toma, se embebeda de mim.

- Fim de ano!
Fim de ano é gente que sai da escola, gente que chega, parentes vêm me visitar, amigos que vão viajar, outros mudarão. Tenho perdido tanto sono imaginando rodoviárias, estações de trens e aeroportos.
Desconheço locais de maior contraste entre felicidade e alegria.

Não sei bem ao certo, se era a última segunda-feira de Julho ou a primeira de Agosto. Mais que duas pessoas na rodoviária, esperando um ônibus pra levar uma só, éramos despedida (assim mesmo éramos despedida). E essas despedidas cortam muito, porque nunca sabemos que ônibus acidentará, que ônibus é seguro. Nunca acreditei que depois de pisar naquele ônibus eu voltaria.
Pelas frestas dos meus olhos saíam gotas de lágrimas, uma atrás da outra formando uma pequena correnteza em meu rosto. Era impossível olhar reto, era impossível não querer abraçar, chorar, rir, pensar, imaginar.

16º na plataforma G2 de Belo Horizonte

Olhei para os lados e vi tanta gente rindo, tanta gente chorando. Caras de sono, de insônia, travesseiros arrastados, vendedores de água gritavam, o ruído de motor era algo quase asmático. Torcia por um atraso, aquele ônibus não podia me levar assim, tão assim. Era como deixar o tempo todo para trás, tudo era tão... Tão silêncioso, mesmo entre tanto tumulto.
_ Em dezembro a gente se vê.
_ Não sei porque estamos chorando.
Alguém até disse algo depois disto, mas o fiapo de voz embargada pelo choro não era suficiente para vencer o ruído dos motores, ou os gritos dos vendedores de água.
Um abraço.
A cabeça não parava de rodar. Era tanta gente chegando pra ficar, chegando pra depois também partir, voltando de onde veio, indo pra onde nunca foi, indo pra sempre, indo por uns tempos. A mistura de lágrimas, sorrisos, abraços frouxos e apertados era tanta, tanta.
E por um milésimo de silêncio, que eu quase deixei escapar, ouvi Raul soletrar ao pé do meu ouvido:






Ó, olha o trem, vem surgindo de trás das montanhas azuis, olha o trem 
Ó, olha o trem, vem trazendo de longe as cinzas do velho aeon 
Ó, já é vem, fumegando, apitando, chamando os que sabem do trem 
Ó, é o trem, não precisa passagem nem mesmo bagagem no trem 
Quem vai chorar, quem vai sorrir ? 
Quem vai ficar, quem vai partir ? 
Pois o trem está chegando, tá chegando na estação 
É o trem das sete horas, é o último do sertão, do sertão 
Ó, olha o céu, já não é o mesmo céu que você conheceu, não é mais 
Vê, ói que céu, é um céu carregado e rajado, suspenso no ar 
Vê, é o sinal, é o sinal das trombetas, dos anjos e dos guardiões 
Ó, lá vem Deus, deslizando no céu entre brumas de mil megatons 
Ó, ó o mal, vem de braços e abraços com o bem num romance astral

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Pesquisa

04/08/2009

No final de 2007 eu perdia o sono semanalmente pensando em algum texto. O cansaço físico me impedia levantar da cama para anotar os poemas, textos e frases que vinham à cabeça. Criei então o Segundo Lílian, em Junho de 2008. Postando anotações feitas na madrugada, sonhos rememorados na manhã seguinte, inspirações do meio do sono vespertino. Sem habilidade de escrita tive um blog trágico, perdi meus leitores e a vontade de escrever.
No final daquele ano resolvi criar o Insônia Registrada. Já que todos meus textos eram decididos durante a insônia, ou me tiravam o sono. Era um novo blog, pensado diferente, com novo tema, nova forma de escrita, novo visual - que já foi modificado uma dezena de vezes - além de agora um período de vida bem mais traduzível em letras.
Hoje, o blog já virou um vício. Textos, links, vídeos, descobertas, lembranças... tudo vem pra cá. Tirando o sono de quem lê também. Tamanho vício me levou a criar um blog de esportes, um de filme, participar brevemente de um blog de humor e me fez até perder a vergonha do Segundo Lílian.
Porque segundo Lílian, a insônia será registrada.