Esquina


Talvez fosse mais fácil ser aquela que nunca fui: o outro lado, meu oposto. Afinal, é difícil ser a antagonista da própria história. E quem sabe se eu não comparasse tanto, não pensasse tanto, se eu escrevesse menos; quem sabe assim conseguiria eu acreditar em saudade, em amor ou em desculpas.
Fosse eu menos egoísta comigo mesma, aprenderia a gostar das outras pessoas e sentiria minha pele ferver menos com as coisas pequenas que não faço. Mas se eu fosse assim deste outro jeito, admiraria de longe os que conseguem ser insensível suficiente para ignorar o resto da cidade.
Certo que vejo duas cidades, em dois tons. De um lado a cidade colorida demais, sorrisos demais, pessoas demais, idiotice demais pra eu absorver. Subtraio. Contraio todos os músculos ao passar por ela. Enquanto isto, sob a divisão de uma calçada o outro lado da cidade tem tons cinzas, exatamente pra não observarmos seu humor e sim seu valor, os detalhes, observar o poste colocado um pouco torto à esquina e o mais importante, perceber que a esquina nos dá a opção de entender que a rua acabou, e voltar. Ou acreditar que depois daquela parada a gente vai dobrar a esquina e nos dividir entre os dois tons da cidade, seremos dobro.
Adoro minha cidade cinza, com rios sujos. Na cidade cinza as pessoas não sorriem quando se conhecem, sorrisos são reservados apenas para os mais intímos, pra não dizer os mais importantes.

Então a solução é dormir até mais tarde, pra ficar acordado até mais tarde e passear sob a luz dos postes, ninguém está na rua. Você está, eu também. E podemos ficar horas parados na esquina observando ela se dobrar, o poste cansa de ficar parado a frente da esquina, mas ele não entende que esquina não tem frente, esquina tem diagonal.
Talvez depois de duas horas observando a esquina a gente consiga perceber que ser pista reta cansa. A pista reta torna-se inquieta ao perceber que por mais que faça força um horizonte some lá na frente sem que ela consiga explicar o porque deste tal negócio de perspectiva. A esquina não se cansa, a esquina olha para um lado e para o outro, as vezes em diagonal também. E quando cansa de pensar porque não consegue ver além, ela troca para o outro lado.
É um olho dividido em duas metades, e não como os animais que têm um olho pra cada metade. A esquina é mais humana que todos nós.

P.S: Quando postei esqueci de falar, é pra ler ouvindo Línox - Tons da Cidade (lembrei a tempo?)




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Pesquisa

04/08/2009

No final de 2007 eu perdia o sono semanalmente pensando em algum texto. O cansaço físico me impedia levantar da cama para anotar os poemas, textos e frases que vinham à cabeça. Criei então o Segundo Lílian, em Junho de 2008. Postando anotações feitas na madrugada, sonhos rememorados na manhã seguinte, inspirações do meio do sono vespertino. Sem habilidade de escrita tive um blog trágico, perdi meus leitores e a vontade de escrever.
No final daquele ano resolvi criar o Insônia Registrada. Já que todos meus textos eram decididos durante a insônia, ou me tiravam o sono. Era um novo blog, pensado diferente, com novo tema, nova forma de escrita, novo visual - que já foi modificado uma dezena de vezes - além de agora um período de vida bem mais traduzível em letras.
Hoje, o blog já virou um vício. Textos, links, vídeos, descobertas, lembranças... tudo vem pra cá. Tirando o sono de quem lê também. Tamanho vício me levou a criar um blog de esportes, um de filme, participar brevemente de um blog de humor e me fez até perder a vergonha do Segundo Lílian.
Porque segundo Lílian, a insônia será registrada.