Medo Árduo

Um dia tenso. Dois cigarros, que restaram do maço. Um restinho de líquido dentro do isqueiro, com muita paciência e quase desistindo do vento conseguiu acender o cigarro. Olhava tão distante e pensava em tudo que já tinha passado.
Ele lembrava de ter acreditado em muitas coincidências numéricas, muito mito ao seu redor. Seus pés sempre em ritmos lentos, quase parecia não sair do lugar, balançando o corpo no ritmo de uma música (sem letra, que é pra não pensar). Tudo era tão insignificante diante daquele olhar inquieto que completava todos os ângulos possíveis pra olhar a rua, as pessoas, dentro da sua órbita ocular, olhava pra si e mais uns: os de fora.
Transeuntes tranquilos eram vítimas de suas miradas, observações despercebidas a pontos estratégicos que ninguém mais queria olhar, traduzia tudo depois: em letras, riscos e curvas, nunca retas. Era, para ele, tão díficil pensar em duas coisas ao mesmo tempo quanto olhar no rosto de quem lhe dirigia a palavra. Talvez fosse por esta razão que passassem despercebidos seus traços do rosto, e ninguém sabia descrever muito bem como ele era.
Seu sorriso? Ninguém nunca deve ter visto, não era de gargalhadas também.
As ruas sempre lotadas, todos esbarrando uns nos outros. Ele parecia andar com uma proteção, ao seu redor um círculo quase perfeito, ninguém ousava ultrapassar os limites imaginários e invadir sua área. Só ele não percebia que não era tocado. Nada efusivo. Aos poucos foi virando personagem de um livro, alguém o observava de um ponto que nem ele, com seu olhar esperto procurando pontos imperfeitos, conseguiria encontrar.
Seu nome não era Aaron e ele não era um mito, só não fumava.

Duas opções de trilha sonora para o texto:

→ a visão da personagem sobre si mesmo: http://www.youtube.com/watch?v=yLq86IcoYtI
→ uma paixão trocada pelos cigarros (coisa de personagem mal escrito): http://www.youtube.com/watch?v=qCPwEgAXsnc


2 comentários:

Anônimo 18 de março de 2009 às 11:12  

Finalmente um tempinho pra escrever... ...ainda vivendo o que li mas, neste caso com uma sensação diferente... ...como incorporar uma vida que já se vive em tempo integral ?
Ainda me sentindo homenageado, mas agora sem palavras para dizercomo é se sentir homenageado. É engraçado ver falar do círculo, da distância, da falta de um rosto definido, e de um sorriso... ...esse Aaron... ...é mesmo muito parecido. Esse medo é mesmo muito árduo. E eu estou confuso mais uma vêz...


edo...

Wilson Torres Nanini 21 de março de 2009 às 20:07  

Esse cara estava parecendo personagem de um filme dramático, como De olhos Bem Fechados, por exemplo. Havia uma aura estranha, quase sagrada ao seu redor, salientado pelo fato de que o personagem não se contaminou com o cigarro, tornando-se imaculado. Ótimo texto.
Abraços.

Pesquisa

04/08/2009

No final de 2007 eu perdia o sono semanalmente pensando em algum texto. O cansaço físico me impedia levantar da cama para anotar os poemas, textos e frases que vinham à cabeça. Criei então o Segundo Lílian, em Junho de 2008. Postando anotações feitas na madrugada, sonhos rememorados na manhã seguinte, inspirações do meio do sono vespertino. Sem habilidade de escrita tive um blog trágico, perdi meus leitores e a vontade de escrever.
No final daquele ano resolvi criar o Insônia Registrada. Já que todos meus textos eram decididos durante a insônia, ou me tiravam o sono. Era um novo blog, pensado diferente, com novo tema, nova forma de escrita, novo visual - que já foi modificado uma dezena de vezes - além de agora um período de vida bem mais traduzível em letras.
Hoje, o blog já virou um vício. Textos, links, vídeos, descobertas, lembranças... tudo vem pra cá. Tirando o sono de quem lê também. Tamanho vício me levou a criar um blog de esportes, um de filme, participar brevemente de um blog de humor e me fez até perder a vergonha do Segundo Lílian.
Porque segundo Lílian, a insônia será registrada.