Viu a data no jornal. Apoiou os cotovelos no joelho. De lado anotou no rodapé: a data, mesmo que não fosse lembrar no dia, mesmo que não fosse ler o rodapé depois. Anotou a data do jornal, no rodapé. Na TV passava a guerra e na janela os carros. Preferiu a janela.
Um vermelho, outro branco, dois cinzas, azul marinho e um preto de luxo. Sentiu sua vida correr com os carros. Percebeu. Notou que a vida ia passando em contagem regressiva sem que soubesse em que número estava. Talvez lhe faltasse pouco. Caminhou até a casa, alongou os braços e bocejou. Espreguiçou.
A música bem baixa pra espantar a solidão. Ela estava só, mas não sentia solidão. Mesmo assim, a chuva insistiu em visitá-la. Visita é com s, pensou sozinha. Buscou um livro na estante, dois quadros na parede. Na varanda sentou ao sol, evitou as cadeiras, usou o chão.
Com os olhos percorreu a grama do vizinho, escorreu os pensamentos e anotou: 1428. Sem lembrar o motivo. Pensou em espanhol e concluiu em francês: Le Monde e sorriu achando engraçado que a paz só existia onde havia o caos. Resolveu pensar grego e tropeçou na mortalha de Penélope e procurou seu Dionísio.
Tentou lembrar de novo de onde vinha o número, não conseguindo foi dormir. Aquela noite sonhou muito, sonhou com sua velha casa, onde moravam os pais, na Rua Dionísio, São Paulo - SP, 1428, ap. 203. E acordou!
1 comentários:
"evitou as cadeiras, usou o chão"
a gente fica mais perto de nós mesmos sentados no chão
e você entende de narrar, hem.queria conseguir uns escritos espontâneos assim
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